A polêmica da National Dex. Apenas uma decisão ruim ou uma necessidade para a franquia?


Pokémon Sword & Shield vem aí e dentre diversas novidades uma notícia em particular está dividindo a comunidade. Infelizmente não será possível transferir todos os Pokémon de gerações passadas para os novos jogos e isso está dando o que falar entre os fãs.

Toda geração tem sua seleção de monstrinhos, entre novos e antigos, e nunca foi possível pegar todos em um mesmo jogo. Sempre foi necessário comprar vários games, transferir Pokémon ou trocar com amigos para completar a National Dex.

Agora, o que muda com Sword e Shield? O problema dessa vez é que centenas de monstrinhos não poderão nem mesmo ser transferidos de gerações passadas para os novos jogos. A regra é que se o Pokémon já não estiver disponível em Sword e Shield, então ele não poderá vir para os jogos pelo Pokémon Home (sucessor do Pokémon Bank).

E isso é um problema?

Sim. Não é um problema para jogadores mais novos na franquia e nem para aqueles que não possuem apego pelos seus monstrinhos. Mas para uma grande parcela da comunidade, ser capaz de trazer seus Pokémon favoritos a cada novo jogo é uma questão emocional.

Eu posso falar pelo exemplo mais próximo que conheço disso: o meu próprio. Eu possuo um Blaziken que foi meu primeiro Pokémon lá na versão Ruby e desde então carrego ele comigo por todos os jogos. É uma lembrança de todas as versões pelas quais já passei. Principalmente aquelas que deixam uma ribbon da região no “summary” dos meus Pokémon.

Não se deve entrar aqui no mérito de questionar se é esquisito o apego a “um punhado de dados”. É natural do ser humano criar laços emocionais com objetos e, neste caso, personagens virtuais. Inclusive este é o grande motivo da Game Freak ter inventado e dado suporte à transferência entre gerações por tantos anos.


Vejo muitos jogadores achando que as reclamações vem de gente que quer “apelar” com Pokémon de nível 100, mas esse não é o ponto. A transferência é um direito do jogador, seja por querer apelar no pós-game, seja por motivos emocionais ou só pra facilitar as lutas quando for subir o nível de monstrinhos pro competitivo.

O ponto aqui é que é uma tradição que está sendo alterada depois de mais de 10 anos na franquia. Como eu falei, é um problema de jogadores veteranos, que vem acompanhando os jogos a cada geração. Mas é importante observar que a mecânica não está sendo removida, apenas parcialmente limitada.

Quais as justificativas?

Sabemos que não é o fim das transferências Pokémon. Todos os monstrinhos existentes irão se encontrar no serviço Pokémon Home, vindos do Bank, do Pokémon GO e até mesmo dos games Let’s Go. Então porquê as limitações em quais Pokémon poderão ser enviados a Sword e Shield?

As justificativas são as seguintes:

  • Balanceamento do metagame: De longe a explicação mais esfarrapada para a decisão, pois basta a criação de regras específicas nas batalhas online para limitar quais Pokémon podem, ou não, ser usados em determinados formatos ou temporadas.

    Para fins de comparação, o formato de batalhas oficial (VGC) contou com três regras diferentes ao longo deste ano. Acredito que o sentido real da informação é que a seleção de monstrinhos presentes no game foi pensada para balancear já sabendo que alguns seriam cortados e não devido ao competitivo em si.
  • Estratégia de marketing: Esta não é uma justificativa oficial, mas vejo muitos treinadores dizendo que é um grande plano para vender mais obrigando os jogadores a comprar os novos jogos se quiserem ter determinados Pokémon que não aparecerem em Sword e Shield.

    Devo discordar, pois os Pokémon capturáveis em cada game já são limitados com esse propósito. Vale lembrar que quem faz transferência geralmente já acompanha fielmente a franquia e compra cada novo game lançado. Eles tem mais a perder do que a ganhar limitando a transferência.
  • Tempo hábil de programação: Uma das explicações oficiais e a que eu acredito que seja mais próxima da realidade. De início eu pensei “é pura preguiça, eles têm recursos para isso” mas, conforme fui pesquisando sobre programação e game design para escrever este texto, devo dizer que comecei a entender o lado da Game Freak.

Você ta passando pano pra Game Freak?! Não acredito!!!

Não. Não estou passando pano porque, assim como vários de vocês, eu já me senti lesado com a ausência de um Pokémon Z, a troca do PSS por aquele lugar horrível e claustrofóbico que é o Festival Plaza, dentre tantos outros vacilos da Game Freak. E isso inclui a polêmica da National Dex.

Porém, como já mencionei, estudei sobre o assunto e a coisa não é tão fácil quanto parece. Era simples adaptar os monstrinhos da sexta para a sétima geração pois era o mesmo console, mas com a mudança de hardware não basta copiar e colar os códigos.

O Nintendo Switch exige toda uma reprogramação feita do zero, mesmo que criada em cima dos padrões de movimentação dos títulos de 3DS. Neste vídeo é utilizado um exemplo matemático muito interessante para ilustrar a quantidade de trabalho envolvida na programação de cada Pokémon:

Supondo que cada Pokémon precise de 6 animações de batalha para ter um set completo dos seus movimentos, isso significa (720 x 6) um total de 4.320 modelos a serem trabalhados. Se forem 7 animações, então o número sobe para 5,040 e por aí vai.

Este foi um exemplo antes de Sun e Moon. Se contarmos com o número atual de monstrinhos (809 x 7) temos 5.663, sem incluir Mega Evoluções, Alola Forms e outras formas alternativas. Sob essa perspectiva a justificativa parece mais plausível, não?

Alguns podem argumentar “As animações de batalha nem estão grande coisa e o Nintendo Switch tem potencial para isso”. Sim, de fato tem e seria perfeitamente possível fazer todos os Pokémon para os games Sword e Shield não fossem os aspectos que todos parecem estar esquecendo quando utilizam o argumento das animações de batalha simplistas.

Os Pokémon não tem animações somente nas batalhas. Estamos todos esquecendo do Pokémon Amie / Refresher que apesar de não ter sido anunciado, muito provavelmente vai fazer parte dos novos jogos. No rumor que vem acertando tudo sobre os games é dito que a nova forma de brincar com os monstrinhos é em um acampamento.

Imagine quantas animações não são necessárias para fazer cada interação do monstrinho em um ambiente desses. E não vamos esquecer das animações dos Pokémon que irão aparecer por todo o mapa em tempo real.

Então devemos ficar do lado da Game Freak?

Não. Não é porque compreendemos melhor o lado do desenvolvimento que devemos aceitar 100% e ficar calados. É importante demonstrar nosso descontentamento e desejo de ver todos os monstrinhos em Galar, porém acredito que seja um pouco em vão. Eles já informaram que, pelo menos por enquanto, não há planos para uma DLC com todos os Pokémon.

Acredito que o motivo por trás disso seja um planejamento para o futuro. Com o aumento de Pokémon a cada geração, vai ficando cada vez mais trabalhoso lidar com os jogos da franquia a tempo de um lançamento anual. E é aí que mora o verdadeiro problema.

Não é impossível ter todos os Pokémon programados em Sword e Shield, mas demanda muito tempo. Infelizmente a The Pokémon Company adotou a postura de lançar um game novo por ano e a Game Freak é obrigada a priorizar isso em detrimento da presença de todos os monstrinhos em Sword e Shield.

Muito provavelmente nos jogos seguintes nós vamos ter mais Pokémon antigos e quem sabe, ao fim da oitava geração, um grande game com todos os monstrinhos novamente para encerrar com chave de ouro antes de recomeçar esse ciclo no console seguinte. É possível que este se torne um novo padrão na franquia e Sword e Shield nunca recebam o tão sonhado DLC.

No fim é tudo uma questão de prioridades da empresa que optou por favorecer a agenda já lucrativa de um game ao ano. Não é uma estratégia de marketing, principalmente com a repercussão negativa, mas não deixa de ser uma forma de garantir o lucro constante que os games principais de Pokémon produzem.

E não é apenas dizer “eles tem dinheiro, que contratem mais gente pra fazer mais rápido”, uma empresa é algo mais complexo do que isso infelizmente, essa é uma forma infantil de ver as coisas. A solução seria o boicote, mas além de ser impraticável a nível mundial, eu acredito sinceramente que este não é um motivo para se boicotar o jogo.

É uma grande perda para os fãs de longa data como eu, mas a longo prazo é apenas uma questão de costume. Vale lembrar que os games da série principal ditam todo o merchandising da franquia (anime, brinquedos, cards, etc) é por isso que a The Pokémon Company não vai abrir mão de um lançamento anual.


Para os colecionistas, resta a Pokédex do Pokémon Home. E o serviço também acaba sendo a última esperança para aproveitar os monstrinhos que não poderão estar no Switch (pelo menos por enquanto). Em entrevista já disseram que Pokémon Home terá outras funções além de troca e depósito.

Quem sabe não implementam um sistema de batalhas? Mas sou suspeito pra falar, eu adoraria batalhar no celular, acho mais prático do que carregar um Switch por aí. Também gostaria de algum sistema de pet virtual usando nossos monstrinhos favoritos. Eu gosto dessas coisas.

Com ou sem National Dex, Pokémon Sword e Shield prometem ser excelentes entradas na franquia dos monstrinhos de bolso e não deveríamos deixar a ausência de uma função opcional (por mais frustrante que seja) prejudicar a experiência que os games tentarão nos proporcionar no main game.


*Raphael Barbosa é fã da franquia desde 1999, mas começou sua jornada somente em 2004 na região de Hoenn. Seu monstrinho favorito é Blaziken, seu primeiro parceiro Pokémon. Seu maior sonho de treinador é um aplicativo no estilo pet virtual para poder interagir com seus monstrinhos de forma semelhante a um tamagotchi.

Raphael Barbosa

Mestre Pokémon de longa data, salvador de Hyrule em todas as encarnações do herói e ocasionalmente um encanador de bigode grosso.

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